quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Janelas Solitárias

O sol nasce para todos, mas nem todos nascem para o sol. A essência da desigualdade está no modo distinto de seus relacionamentos com A grande estrela. Bate 30 graus, pedra sob pedra bate o pedreiro; afunda seu corpo no mar o amante, debruça-se entre o emaranhado congelado pelo ar condicionado o distante, só faz reclamar do calor quem anda de elevador, ta nem aí o circulante.

Nas férias o Sol vira pop star, todos viram os corpos pra ele e torram seus dinheiros para ficarem a sua mercê. Será a influência midiática impondo-nos a gastar no verão? Falo, porém, do Sol cotidiano. Aquele que a minha janela ostenta, mas sofre de um mal: indiferença. Não seria esse Sol o mesmo do mês passado? Será, realmente, a falta de tempo das vidas que voltaram a sua rotina? Ou na verdade, é a falta de vida que há na rotina? Os domingos de janeiro são cheios de alegria, os de fevereiro ranzinzam. Fomos acostumados a valorizar o que a televisão quer, mas e o verão constante dos nossos quintais cotidianos? Passam tais como as nuvens passageiras.

Escrevo-me, ao final de maio de 2008, em Montreal: “Fez sol, fizeram-se risos. Hoje, pela primeira vez, a senhora com quem espero o ônibus, todos os dias, a quem julgava ser a bruxa do bairro (pelas suas faces frígidas matinais diárias), doou-me um belo sorriso, um bom dia e ainda de quebra afirmou, meio me perguntando, o quanto bonita era aquela manhã!”. A partir dali, os parques ganharam vida, as ruas movimentos, os rostos colorimentos, os pedestres comprimentos, meus pés havaianas, a cidade festivais, e eu ganhei uma nova Montreal. A cidade se escondia debaixo da neve! Recebeu um quê enlouquecido nos quatro cantos, agora levantados pelos raios solares.

- Como sabem aproveitar o Sol, dizia eu. Não eram ainda férias, mas todos os dias ensolarados eram paisagens sorridentes, o silêncio chegava tarde, pois escurecia apenas aos arredores das 8 horas.

De volta ao Brasil, no país do calor, eu me encontrava com saudades do Sol canadense. No outro dia, apesar de ser agosto: céu azul, nuvens escolhidas a dedo, mas uma surpresa: parques vazios, praias e piscinas solitárias. Transporto-me para o Norte, aquela certeza de felicidade por uma janela sem cortinas.

Enfim, quando aprendemos a desvalorizar a dádiva que temos abundante? Em vez de ressaltar as seqüelas de uma sociedade errante, deveríamos, por hora, fazer companhia as janelas empoeiradas nas manhãs corridas de uma quarta-feira.

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Luzes de consciência

Quando as luzes da consciência disfarçadas de raios solares acharam a fresta esquecida pela cortina, aquelas rugas matinais apareceram e os olhos se abriram. Como a ebriedade combina com a manhã! Há algo de misterioso na relatividade: não é o ambiente, as pessoas, o estado de espírito. Tudo depende da hora do dia. De noite não existe ressaca, a dor de cabeça é da vida e matinal. O cérebro de certo inchava e voltava ao normal na colaboração de uma conspiração social que a fazia não querer sair da cama, mas era preciso porque a luz começava a incomodar não apenas o seu bom-senso, mas também o calor que bate às 6 horas de um céu ensolarado. Levantou e se deparou com a única pessoa que não gostaria de ver.

- O que está fazendo aqui?

Não tinha respostas. Estava sempre rodeada de pessoas menos desagradáveis, e logo naquele dia se encontrava só e olhando para a única das quais não se sentia a vontade. Aqueles silêncios constrangedores e sinais de incomodo sempre apareciam quando elas se deparavam sem um terceiro para quebrar o clima ruim.

- Quantas vezes precisarei dizer o quanto lhe odeio?

Não se orgulhava da noite passada, das anteriores, e de uma vida toda. No entanto, quando chegava a noite, ao lado de outrem, estava bem. O seu problema era quando a inconveniente visita lhe aparecia de manhã. Engraçado que quando chega essa hora do dia, o mundo parece mais brando, porém as pessoas de ontem, em seus íntimos, continuam cruas e cruéis tal como a noite. Não se enganava pela leveza solar, julgava aquela a quem olhava como se soassem as 24 badaladas no relógio da sala.

- Por favor, desapareça!

Costumava fingir que ela própria não era ela, escolhia alguém a quem admirava e fingia ter a vida dessas para se confortar. Vivia de sonhos e imaginação para esquecer a injuria da mistura de vergonha e decepção que tinha consigo. Há muito deixara de ter pena de si mesma, passou a ter ódio. A raiva de não ser bem sucedida na vida, em todos os extremos. Era uma espécie de conforto não ser ela, mesmo que por poucos minutos, em seu mundo fantástico que tinha as beiras da cabeça, tinha dignidade e bem estar.

- Por favor, me deixe!

Perdera os vestígios de auto-estima nas humilhações que havia sofrido na adolescência. Hoje para os olhares desatentos do mundo passava indiferente, mas por dentro ainda era aquela frágil menina com o coração inundado de lagrimas. Julgavam-na fria e forte. Mas era a sutileza quebrada pelos ventos fortes da vida e a fraqueza erguida pelas mãos vis que lhe estenderam apenas pedras quando precisava de suporte. Toda noite encontrava consolo nas garrafas de vinho baratas e colecionava desgraças.

- Será que algum dia acordarei sem querer te matar?

Toda manhã era um processo doloroso o encontro com o espelho.