segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Um delicioso peixe fora d´água

1968, a União Soviética invade a capital da Tchecoslováquia, no movimento conhecido como a Primavera de Praga. Em algum lugar da Paraíba, dois estudantes conversam:

- E essa invasão?

- Mesmo se a gente não entende, se foi a União Soviética, a gente aceita.

Essa estória que meu pai contava me lembra que estou sempre fugindo de limitações. Prefiro ser atéia e apartidária por ter a sensação de liberdade de se eu quiser, por exemplo, adorar, um dia, o passarinho que fez ninho na minha casa ou não crer em nada, e poder ouvir todas as propostas eleitorais sem preconceitos. Tenho receio de grupos fechados por observar certo individualismo coletivo: torna-se tão interessante e confortável olhar para os nossos ditos semelhantes, que o mundo de fora vira uma questão secundária. Enquanto que, para mim, existe uma deliciosa pretensão em sentir-se diferente. Foi preciso viajar para o ver o quão pequeno era o meu mundo. Primeiro foi o planeta multicolor, tão grande e tão complexo. Veio então a sensação verdadeira de que não conhecia nada, e a minha cidade, uma hora tão grande, surgiu como um pequeno ponto lá no Brasil. E depois foram as pessoas, inexistiam ali quaisquer semelhanças com minhas auto-definições. Eu nada sabia de mim e quem dirá dos que eu julgava distantes. Tornaram-se grandes e eternos amigos ou protagonistas de inesquecíveis conversas, pessoas que naquele ponto minúsculo passariam despercebidos, diferentes demais. É claro que me considerar fora de certos grupos já é, em síntese, pertencer a uma outra parcela. A forma de sentir-se livre destoa entre as mentes, e no meu âmago, foi a encontrada para me satisfazer. Nínguem, em seu interior, está livre das amarras repressoras e invisíveis do mundo que vivemos.

Afinidade não é nada mais que estado de espírito. Assim como o amor e todas as outras boas sensações da vida. As pessoas amam quando se abrem para isso. As relações não têm nada a ver com o gosto musical ou preferência de lugares para sair. A convivência e o começo delas talvez, mas tudo acaba dependendo da sua vontade interior e a necessidade de se abrir a novos ares. Identificação se amplia ao encontro de boas energias, a paz que alguém possa lhe oferecer e não ao conforto de visões restritas. Nem todos os seguidores de alguma ramificação são da mesma radicalidade do jovem paraibano do começo da história, mas atento apenas para a visão turva que por vezes nos oferecem os dogmatismos e as frases que começam por “eu sou” e precedem idéias que podem, com o maior dos direitos, não convir amanhã.

- Hoje sigo apenas a democracia, seja de qualquer lado, se for contra a soberania popular estou fora, se fizer a favor apóio. Diz, hoje em dia, o primeiro dos jovens lá de cima.

De uma estimada sabedoria os cabelos brancos devem gozar.

Um comentário:

Mariana Barros disse...

chorei lendo isso deita no nosso sofá de baires sozinha em casa... te amo amiga